segunda-feira, 10 de novembro de 2008

Obama venceu, o povo estadunidense não

Por  Rodrigo Lima

O dia 4 de novembro certamente entrará para a história. O país mais racista do mundo, que construiu toda a sua historia sobre a hipocrisia de um falso discurso democrático e de liberdade para os seus cidadãos, elege o primeiro presidente negro da sua história.A importância da data será muito mais lembrada pelo simbolismo que carrega esta vitória do que propriamente pelas "mudanças" que virão com ela. Obama é o presidente mais caro da história americana, nunca um candidato arrecadou e gastou tantos dólares em uma campanha presidencial quanto ele. E de onde saiu este dinheiro? De contribuições espontâneas de cidadãos comuns ávidos por mudanças em seu país, ou dos cofres das grandes corporações que, desde sempre, comandam o rumo que a política estadunidense irá tomar?

Obama vai responder aos interesses do sistema que o elegeu, e não aos interesses reais dos setores oprimidos dos EUA. É o rosto suave do capitalismo agressivo e selvagem que seguirá sendo produzido pelo imperialismo.A pintura de "progressista" como alguns comentaristas políticos tentam pintar não esconde o que vem atrás da máscara. Em seu programa de governo existem temas como a retirada das tropas ianques do Iraque, mas o que não é dito é que Obama vai manter e aumentar o contingente das tropas presentes no Afeganistão, que é hoje a frente de batalha onde os EUA mais sofrem baixas e onde não conseguiram dobrar a resistência talebã. É o cobertor curto, mata-se menos no Iraque, multiplicam-se as mortes no Afeganistão e dentro em breve possivelmente no Paquistão, país que está na mira de Obama, que declarou atacará caso o governo paquistanês não siga atuando em conjunto com os EUA na ocupação do território afegão.No cenário interno Obama fala em universalizar o sistema de saúde. Hoje nos EUA 40 milhões de pessoas não tem nenhum acesso ao sistema de saúde, já que no país mais rico do mundo, somente usufrui de cuidados médicos quem tem dinheiro para pagar por eles. Obama vai romper com a lógica mercantil vigente no seu país? Dificilmente o futuro presidente vai mexer com os interesses das grandes corporações ligadas ao mercado da saúde.O novo presidente vai enfrentar a maior crise que os Estados Unidos já viveram depois de 1929. A crise vivida pelo capital, não será superada em favor da classe trabalhadora com o "mini" new deal de Obama. Até porque o setor a ser privilegiado por Obama seguirá sendo a burguesia financeira, estendendo algumas concessões à classe média e deixando de fora os setores mais desfavorecidos da população, inclusive a classe trabalhadora.O novo presidente dos Estados Unidos seguirá muito provavelmente com a mesma postura conservadora que o caracterizou em seu mandato como senador. O próprio programa eleitoral de Obama não se difere substancialmente do programa republicano, não apresenta proposta no sentido de um controle sobre o sistema financeiro, ou de uma reestruturação da economia estadunidense.

Obama, com um apoio midiatico e com uma campanha que apelou para a comoção nacional é a resposta que o sistema produziu para uma "mudança" que mantenha as coisas no seu devido lugar. Os republicanos não tinham essa capacidade, visto que os oito anos da era Bush minaram qualquer possibilidade de continuidade deste partido no comando da Casa Branca.Em seus discursos, Obama, sempre se coloca como acima das classes, sua bandeira é a "América" e a defesa de todos os valores que vem com ela. Obama está muito mais para uma Condolezza Rice, do que para um Huey Newton. Representa o negro de classe média integrado ao sistema, muito longe da tradição de luta dos negros por ampliação de direitos, como foi o caso de Luther King, Malcom X ou os Panteras Negras.A ilusão criada em torno do nome de Obama não esconde os rumos que serão adotados nos próximos quatro anos. Para que realmente haja uma mudança, Obama deve "desprivatizar" os sistemas de saúde e educação dos EUA, distribuir renda, controlar o sistema financeiro, no plano interno. Parar com as ocupações estadunidenses em qualquer parte do mundo, acabar com o plano Colômbia, derrubar o nefasto bloqueio contra Cuba, não assinar nenhum novo TLC, eliminar a repressão conjunta com Israel ao povo palestino, no plano internacional.Estas transformações não virão com Obama. As estruturas e amarras do sistema seguirão bem sólidas, a mudança que traz a vitória de Obama é simbólica, não é política.Obama venceu, com uma expressiva votação. Mas o povo dos Estados Unidos, representado pelos membros da classe trabalhadora, brancos, negros, hispânicos, asiáticos, não.

Rodrigo Lima, sociólogo e Secretário de Relações Internacionais da UJC.